Entrevista: Levem as regras muito a sério e acreditem na vacina (C/ÁUDIO) – Rádio Tágide

Entrevista: Levem as regras muito a sério e acreditem na vacina (C/ÁUDIO)

Miguel Borges soube que estava contagiado com o SARS-Cov-2 e que a mulher e os filhos também apanharam o vírus. De poucos sintomas no início, os sintomas agravaram e teve de ser internado onde passou momentos difíceis. Teve de levar oxigénio e ser sujeito a uma intervenção cirúrgica por outro problema agravado pelo vírus.

Miguel Borges acusou positivo à Covid-19 a 14 de novembro de 2020, foi internado no Hospital de Abrantes a 21 de novembro. O autarca esteve 19 dias em internamento hospitalar. Esta entrevista gravada a 30 de dezembro de 2020. Miguel Borges retomou a sua atividade na presidência da Câmara de Sardoal na segunda-feira, dia 4 de janeiro de 2021.

 

Entrevista de Jerónimo Belo Jorge

Quando é que descobriu que estava infetado, que sintomas é que teve para contactar a linha? Como foi esse processo antes de vir o teste positivo?

No dia 2 de novembro, submeti-me a um teste que deu negativo, por precaução. Mais tarde, a minha mulher começou a ficar com sintomas idênticos a uma gripe forte, com muitas dores no corpo. Foi à urgência do Hospital onde fez o teste que foi negativo. Também comecei a ter alguns sintomas, alguma tosse, dores no corpo, isto numa quinta-feira. Na sexta-feira fomos novamente às urgências do Hospital e fizemos o teste a 13 de novembro. No dia 14 logo pela manhã tivemos o resultado positivo.

Após o teste, quais foram os passos? Qual é o passo de um cidadão que tem um teste positivo?

Começamos a tomar a medicação, paracetamol, para aliviar algumas dores. Dia 14 os meus filhos começaram a ter sintomas, alguma febre e foram também ao Hospital e depois, no dia 15, soubemos que eles também estavam positivos. Nos mais novos passados dois, três dias os sintomas desapareceram. A minha mulher continuou com alguns sintomas fortes. No meu caso foi diferente porque comecei com algumas dificuldades respiratórias, mas o que foi estranho em tudo isto, recordo-me de na quinta-feira, dia 20, de manhã sentia-me bem, mas à tarde as coisas dispararam de uma forma incrível. Comecei a sentir muitas dores, comecei com febres altas, cada vez maior dificuldade em respirar e com muita tosse. Fui de urgência para o Hospital e fiquei internado. Os comentários, que soube à posteriori, foi que quando lá cheguei, tinha muito pouco pulmão por onde respirar.

No Hospital, percebeu que as coisas estavam a desenrolar-se num caminho em que era necessário ficar uma serie de dias no Hospital?

Não. Sentia-me mal, com muita tosse, dificuldades respiratórias, mas a partir do momento em que entro no Hospital a minha preocupação diminui porque sabia que ia começar a ser tratado. E assim foi, começaram-me a dar medicação de várias formas para aliviar as dores, para aliviar os sintomas. No Hospital eu nunca tive a noção do perigo. Nunca tive a noção que as coisas estavam muito más porque eu não perguntei nada. Estava a ser tratado e isso é que interessava. Este vírus é tão oportunista que ataca todas as nossas fragilidades e tive também um abcesso que me deu dores terríveis. Os últimos 6 dias em que estive internado [que foi quando o abcesso apareceu] que me obrigou a uma intervenção cirúrgica e foram dores desesperantemente fortes.

O SARS-COV-2 é uma gripe. Mas pode realmente descompensar outras patologias. Esse é um receio que existe, que SARS-COV-2 possa despoletar outras patologias?

Eu tive sempre uma enorme confiança no Serviço Nacional de Saúde. Todos os dias sentia-me confortável, tranquilo com os tratamentos. Só depois com a questão do abcesso é que foi mesmo mais duro. Curiosamente, essa preocupação tenho agora neste momento, tenho de tentar perceber o que é que aí vem, tentar perceber o que é que vai ficar do Miguel Borges, claro que neste momento ainda tenho um conjunto de situações que não eram normais em mim, canso-me muito, há uma dificuldade em andar e outras situações também que espero que com o tempo passe. Eu sou um homem com pensamento positivo e com fé, sinceramente nestes dias todos que lá estive nunca achei e nunca tive a noção que as coisas eram tão graves como mais tarde vim a saber.

Dias de muita leitura e escrita ou dias a passar e à espera que as dores passassem?

Muita leitura, escrita não foi tão fácil numa fase porque a posição não permitia. Mas li muita coisa. Escrevi algumas coisas, mas era mesmo também para ajudar a passar o tempo. Mas sinceramente eu hoje tenho uma grande confusão em relação aquilo que se passou naqueles dias porque não consigo distinguir alguns momentos, aquilo que foi um sonho e aquilo que foi realidade. Houve coisas que me aconteceram que tenho a noção de que me aconteceram, fui a procura delas, julgando que materialmente estariam registadas e elas não existem. Algumas ter de as repetir, porque nalguns casos era mais um olhar para as letras e passar as folhas para disfarçar as dores.

Neste tempo de internamento, quando os filhos ou a mulher testaram negativo, teve esse conhecimento? Sentiu alívio, por eles?

Sim. Se bem que os meus filhos não fizeram teste para saber se estavam negativos, cumpriram osdez dias, que até foram mais. Na verdade, a minha maior preocupação, mais do que as minhas dores e do que o meu tratamento era realmente daquilo que se estava a passar em casa porque a minha mulher foi três vezes ao Hospital, das três vezes só passou lá uma noite, mas essa era a grande preocupação. Primeiro, no dia 14 de novembro, acho que ninguém devia passar por isto, de eu estar a janela da minha casa e ver os meus filhos a irem de ambulância para o Hospital. E eu sem os poder acompanhar. Foram momentos muito difíceis. E outro momento difícil foi quando a Ana teve de ir ao Hospital e foi a incógnita “será que fica internada?” E se fica internada quem é que vai tratar das crianças em casa que estão positivas, duas crianças, a Leonor tem 16 anos, o Pedro 13, mas quem é que vai tratar deles? É claro que houve logo um conjunto de pessoas que assumiram o risco, não há problemas, nós vamos lá se apanharmos não faz mal. Mas foram momentos verdadeiramente difíceis, nada comparado com o facto de ter de ser operado, nada comparado com outro tipo de coisas, nós fisicamente temos de suportar dor e estamos preparados para suportar muita dor, mas a parte emocional, merece mesmo muito ser cuidada. Preocupamo-nos com quem está no Hospital e às vezes esquecemo-nos que o cuidador ou que a família próxima também está a sofrer bastante.

Apesar da vacina ter começado esta semana a ser administrada vai demorar ainda algum tempo a chegar a comunidade. Que concelho quer deixar as pessoas que ainda andam por aí que não passaram por esse período?

Eu gostaria que as pessoas fizessem aquilo que eu tenho vontade de fazer, eu gostava de ser vacinado o mais depressa possível. O risco de tomar a vacina é uma coisa perfeitamente residual, uma coisa como acontece com qualquer medicamento. Não sabemos o que vai dar o futuro, tudo aquilo que são as regras que hoje utilizamos, o distanciamento, a máscara, a desinfeção das mãos, a etiqueta respiratória é para manter. Até porque nós não sabemos com quem estamos a interagir. Podemos estar a interagir com pessoas que ainda não levaram a vacina ou que dentro daquilo que é o seu direito se recusarem a levar, como se recusam a levar outras vacinas. Há pessoas que tem estes princípios, que não compreendo, mas respeito. Levem muito a sério as recomendações porque ainda vamos ter um período longo mesmo com a vacina.

Fonte da notícia: Jornal de Abrantes